sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

Bênçãos ou benções?

Por mais incrível que possa parecer, ambas as formas são corretas.
O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (VOLP) registra as formas BÊNÇÃO (paroxítona) e BENÇÃO (oxítona) — observe-se o acento circunflexo a marcar a sílaba tônica da primeira forma.
O plural de BÊNÇÃO é BÊNÇÃOS, enquanto o plural de BENÇÃO é BENÇÕES.
Portanto, ainda que BENÇÃO e BENÇÕES sejam pouco usadas e pareçam formas estranhas, são tão corretas quanto as mais usadas.
Por causas diversas, muitas palavras de nossa língua têm formas duplas ou até triplas, todas atestadas em textos de autores de várias épocas e registradas em dicionários e gramáticas.
O mais adequado é preferir a forma corrente e mais usada, mas sempre há quem resgate, propositadamente ou por acidente — sem querer querendo! (ou apenas sem querer mesmo) —, uma forma variante pouco usada ou quase esquecida, iniciando involuntariamente discussões inócuas sobre sua correção e adequação.
Consultem-se sempre dicionários e vocabulários — se possível, mais de um.

ADENDO: Consultei as versões eletrônicas, disponíveis na Internet, dos dicionários portugueses Priberam e Porto e dos brasileiros Michaelis e Caldas Aulete (não tive acesso ao Houaiss nem ao Aurélio). Apenas o Aulete (obra de origem portuguesa, depois adaptada e muito ampliada no Brasil) corrobora o VOLP e registra a variante BENÇÃO, cuja entrada reproduzo abaixo:

benção
s.f. || forma antiga e popular de proferir bênção. Cp. bênção. F. lat. Benedictio, onis.

A forma BENÇÃO é, pois, no mínimo um arcaísmo, mas daqueles que ainda resistem na fala popular de certas regiões do País; daí o sabor regional e do "tempo do rei" que ainda conserva em nossos ouvidos. Quem nunca recebeu a BENÇÃO de uma pessoa mais velha?
E parece que, em contextos familiares, foi substituída por BENÇA, ficando a impressão de que nos meios populares se vê BENÇÃO como forma mais polida e solene.
Uma explicação para a sobrevivência dessa forma talvez seja sua analogia com os substantivos terminados em -ÃO, quase todos oxítonos. Exceções paroxítonas como ACÓRDÃO e ÓRGÃO são raríssimas; a forma paroxítona ZÂNGÃO foi há muito tempo posta de lado pela oxítona ZANGÃO, também correta.
Assim, mesmo que a forma usada na língua culta ou padrão seja BÊNÇÃO, o semiarcaísmo BENÇÃO ainda nos fará companhia por algum tempo, emergindo vez ou outra até sumir por completo — se é que sumirá algum dia. Como disse Câmara Cascudo: "O povo conhece seu vocabulário".
Critiquem-se pessoas, mas respeitem-se os fatos linguísticos.

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