sábado, 3 de dezembro de 2022

Reciclagem


Elói Elias era morador novo do prédio e ficou contente ao saber que a administração do condomínio tinha instalado recipientes para coleta de material reciclável: tinham cores diferentes e recebiam separadamente plástico, metal, vidro e papel.
"Que bom! Precisamos cuidar do meio ambiente" — pensou Elói Elias.
Dali em diante, Elói Elias separava e juntava o que fosse reciclável e, uma vez por semana, levava tudo até os recipientes, pondo cuidadosamente plásticos, metais, vidros e papéis nas respectivas caixas.
Voltava a seu apartamento com a consciência mais leve, satisfeito por ter feito uma boa ação para a humanidade e o planeta. Lembrava-se com saudade das palavras do chefe do grupo escoteiro de sua infância: "O escoteiro deve fazer pelo menos uma boa ação por dia".
Passaram-se várias semanas. Lá estava Elói Elias, mais uma vez, com seu saco cheio de recicláveis para a coleta seletiva.
Margarida Maria, zeladora do prédio, prestativa e bonachona, viu Elói Elias pondo o material nas caixas e disse:
"Seu Elói, não precisa pôr separadinho, não. Pode pôr tudo numa caixa só. Depois nós juntamos tudo num saco só e jogamos fora."
"Vocês juntam tudo e jogam fora?" — perguntou o surpreso Elói Elias.
"Sim" — respondeu Margarida Maria. — "Colocamos lá fora no dia da coleta. O pessoal da reciclagem abre os sacos e pega alguma coisa que vale a pena para eles, geralmente alumínio. Depois, o que sobra o caminhão do lixo junta e leva para o lixão."
Elói Elias ouviu aquilo, boquiaberto e incapaz de acreditar. Estava estupefato. Para que todo aquele trabalho, se o destino era mesmo o lixão? Por que as caixas separadoras, então?
"Foi aprovado em reunião de condomínio, seu Elói. Alguns moradores fizeram questão. Mas o síndico disse que é só 'pro forma'" — respondeu Margarida Maria, como se lesse os pensamentos dele.
Elói Elias voltou para seu apê abatido, desencantado da vida. O sonho alegria lhe dá, nele reciclagem há...
Quê? Nada disso! Sono? Sonho? Qual! Naquela noite Elói Elias nem dormiu. De raiva! Sentia-se enganado, logrado. Um fracassado. Um otário. "Palhaçada!"
Amanheceu o dia, e ele não tinha pregado um olho. O desânimo ainda iria possuí-lo por mais de uma semana. Mas ele acordou — ou melhor, amanheceu, pois não tinha dormido — naquele dia como um novo homem. Reciclado.
Lembrou-se de uma fábula que sua mãe lhe contara, ou que ele tinha lido num livro de escola. Uma pequena ave voava até um riacho, enchia o biquinho de água e levava aquelas gotas para apagar um incêndio na floresta. Avisada por outros animais, que afastados viam a mata arder, da quase nenhuma efetividade de seu ato, a avezinha respondia: "Estou fazendo a minha parte".
Hoje, quando alguém puxa conversa sobre meio ambiente, reciclagem, efeito estufa, aquecimento global, mudanças climáticas etc., Elói Elias desconversa, diz que não sabe nada sobre esses assuntos, mas acha tudo isso muito legal, e corta o papo.
A coisa é mais forte do que ele, porém. Elói Elias continua a separar seu lixo e a depositar os recicláveis nos recipientes do pátio do condomínio... mas somente quando não há ninguém olhando.

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